"Eles (pequenos empresários) pensam: não vou aumentar a lojinha, não vou abrir um novo mercado, vou esperar a passagem desta crise. Então, seria preciso que houvesse uma palavra de incentivo, que alguém fosse mais otimista"
"É preciso que haja uma perfeita integração entre o governo do DF e o governo de Goiás, na busca para encontrar uma solução de desenvolvimento desses municípios"
"Temos de criar alternativas para aumentar a receita, mas isso deve ser feito com muito cuidado, com muita atenção, com muita discussão"
Presidente da Fecomércio, Adelmir Santana avalia que o medo
da crise afasta investidor de parcerias propostas pelo governo Rollemberg
Em clima de pessimismo, crise e dívidas ainda não honradas do
Governo do Distrito Federal, nenhum empresário vai tirar dinheiro do bolso para
investir em parcerias público-privadas e concessões, como espera o Executivo
local. A avaliação é do ex-senador Adelmir Santana, hoje sem partido,
presidente da Federação do Comércio no Distrito Federal (Fecomércio-DF) e
profundo conhecedor do comportamento do empresariado. Ele fala com a
autoridade de aliado, de quem desembarcou da candidatura de Jofran Frejat para apoiar
Rodrigo Rollemberg no meio da campanha do ano passado. Para Adelmir, diante de
um cenário de medo generalizado na economia, principalmente entre os
investidores, faltam políticos com discursos de otimismo, que apresentem
resultados efetivos à população.
Adelmir
diz que acredita na atual gestão socialista e não se arrepende da escolha. Mas
cobra de Rollemberg atitudes mais positivas. “Falo para ele buscar as
alternativas que a sociedade deseja”, dispara. Ele reforça o discurso do
senador Cristovam Buarque (PDT-DF) — em entrevista ao Correio no último domingo
— da necessidade de Rollemberg usar a criatividade diante da falta de recursos
públicos. Como representante do setor produtivo, classifica de tímida a
aproximação do GDF com o empresariado e aposta no turismo como saída para o
desenvolvimento do Distrito Federal.
Durante a
campanha, o senhor declarou voto em Rollemberg. Seis meses depois do início da
gestão, que análise o senhor faz? Apoiou o candidato certo?
Apoiei
explicitamente. É que ele pegou uma máquina extremamente avariada. Muitas
loucuras que foram reveladas durante esse período de transição, aumento
desenfreado para algumas categorias econômicas, compromissos não honrados,
saldos insignificantes nas contas públicas, embora a oposição diga o oposto. A
sociedade ficou com dúvida quanto a isso. Mas, a cada dia, parece-me que isso
vem sendo esclarecido pela nova equipe. Eu ainda tenho esperanças, confio. Acho
que a opção do momento, na minha visão, foi acertada. Enxergo o governador
eleito como um homem sério, honesto e de boas intenções. Não tenho
arrependimentos por isso. Tenho cobrado do governador mais energia, mais
criatividade. Falo para ele buscar as alternativas que a sociedade deseja. Até
disse para ele: “Quando o eleitor escolhe alguém para dirigente do Executivo,
deposita nele esperança de mudança e de ações rápidas”. Ele é jovem,
inteligente e tem bons propósitos. Vamos achar um bom caminho.
Rollemberg tem bom diálogo aberto com o setor produtivo?
Inicialmente,
foi muito tímido, mas me parece que, a cada instante, isso vai se ampliando. É
necessário que um governante dialogue além dos poderes constituídos, com as
forças do Estado, da sua cidade, e as forças não apenas políticas, mas de
interesse corporativo, das representações, das entidades representativas, do
próprio setor produtivo, que, em última análise, é quem gera emprego, renda e
cobra impostos.
O nome do senhor chegou a ser cotado para ocupar uma
secretaria, certo?
Não. Isso
nunca aconteceu. Talvez por toda esta relação de apoiamento, de amizade. Mas,
na verdade, eu nunca fui auscultado para fazer parte da equipe. Até porque,
quando dei apoio, uma das condições que coloquei foi a de que não fizesse parte
do governo. Não quero participar efetivamente da parte executiva. O que eu
desejo é que dê certo, porque eu acredito nesse projeto, eu acredito na cidade.
Quais medidas
o governo pode adotar para aquecer a economia do DF?
As
soluções para o Distrito Federal de ordem econômica estão fora do perímetro do
DF. Estão na Região Metropolitana, que, de direito, não existe, mas existe de
fato. É preciso que haja uma perfeita integração entre o governo do DF e o
governo de Goiás na busca para encontrar uma solução de desenvolvimento desses
municípios. Todos nós presenciamos, no amanhecer, um volume enorme de população
vinda dessas regiões para o DF, na busca por sobrevivência para manter o seu
emprego, atrás de um bico, de uma atividade qualquer. É um sofrimento muito
grande. Ao mesmo tempo, ela (população) usa equipamentos públicos que,
normalmente, não têm nas regiões de origem. Acho que essa região precisa ter um
dono para que não ocorram problemas mais graves, como, por exemplo, o da
Baixada Fluminense.
Acha que a vocação do DF é essa de serviços, de comércio?
Pela
própria história, aqui é uma cidade administrativa. Nós temos uma vocação para
comércio e serviço em turismo. Uma cidade que tem uma forte presença na área
gastronômica, de hotelaria, de belezas arquitetônicas, até o nosso ipê vem
sendo exaltado. Então, essa é uma cidade que precisa ser vendida, não para nós,
mas para outros. Imagine se nós fizéssemos um planejamento turístico com as
universidades na área de arquitetura. Imagine se o GDF fizesse uma campanha com
faculdades de arquitetura do país objetivando trazer estudantes de arquitetura
para visitar o Projeto Brasília. Imagine se fizéssemos um acordo com todas as
faculdades de direito para trazer os estudantes a visitar Brasília por um
período, subsidiando-os. Imagine se pudessem assistir a uma sessão no Supremo,
ver como funciona o Congresso, os tribunais superiores. Isso é uma aula, é um
estágio de cidadania. Mas imagine também pegar estudantes de serviços sociais
para ver as mudanças na cidade, o turismo religioso. Tudo isso como política de
Estado.
O turismo, então, é a saída para o crescimento?
Não há
dúvida. Isso movimenta tantas atividades, mais de 60. Vai do engraxate aos
taxistas, embora eles tenham problema com o Uber. Por que não incorporar os
taxistas?
Falando nisso,
a grande dúvida é se o governador vai sancionar ou vetar o projeto que proíbe o
Uber. O que o senhor acha?
Acho que
tem de legalizar. Por que não incorporar esses taxistas? Não é com esses carros
sujos e com essa qualidade de serviço que temos. Quem conhece mais a cidade do
que os taxistas? Vamos treiná-los para se incorporarem aos projetos e financiar
novos carros. Olha o quanto movimentaria o comércio. Temos de nos posicionar
para o futuro.
O comércio está vivenciando a pior crise?
Já
vivemos outras crises, mas, no momento, é a mais sensível e evidente, por ser a
mais recente. As comunicações não eram como hoje e há um inconformismo. As
pessoas estão agitadas, muito preocupadas, e vai passando de uma para outra.
Sou otimista, acho que quem exerce função de governo tem de dar palavra de
otimismo. Há um pessimismo generalizado e isso não é bom.
Está decepcionado com a política ou quer voltar?
Acho a
política uma forma grandiosa de servir e tratar os interesses coletivos, de
participar da vida do seu país. Mas não tenho nenhuma intenção de candidatura.
Acho que devo servir a minha cidade, como venho fazendo há anos, com atividades
representativas, de outras formas. Continuo fazendo política todos os dias, mas
de outras formas, sem nenhuma vinculação partidária.
Há tantas lojas fechadas na W3. Isso é a crise ou há outros
componentes?
Tem a
crise e também as próprias mudanças de comportamento do consumidor. Em nenhuma
cidade do país e do mundo, há tantos centros comerciais como em Brasília, como
os shoppings. Isso por conta do estacionamento, da segurança, do
ar-condicionado. Cada shopping tem 300 lojas. O projeto da W3 de revitalização
se discute há muitos anos, mas quando começou o seu esvaziamento? Quando surgiu
o Conjunto Nacional e, depois, o ParkShopping. Temos de repensar isso. Muitos
projetos foram apresentados, inclusive de mobilidade, mas que não chegaram a
bom termo. Há um volume de prédios que estão se deteriorando. O que se
imaginava com o plano de Brasília? Que o comércio local tivesse o sentido de
atender por conveniência, que são lojinhas, padarias, farmácias, peixarias.
Cada quadra tinha mais de um açougue. Hoje, não existem mais açougues nas
quadras comerciais. Por quê? Porque foi um segmento absorvido pelos
supermercados. Aí, entra a criatividade. Outro projeto que se discute é a ocupação
de áreas públicas. Por que não se incentiva a abertura do comércio em vias como
a W3? Incentiva com a redução do ISS e do IPTU, com o empréstimo subsidiado.
O senhor é a favor desse tipo de projeto?
Assim
você desestimula o uso da área pública, que não é escriturada. Como? Cobrando
caro pela sua ocupação. Vamos transformar aquela área (W3) em uma grande área
de lazer, de floricultura, de restaurantes.
Então, muito pode ser feito, mesmo sem dinheiro?
Podem ser
feitas algumas coisas sem dinheiro no caixa. Sou contrário ao aumento de
tributo, seja ele qual for. Temos é de incorporar novos contribuintes, como
aqueles que estão fora da legalização.
O governo fala que não quer aumentar imposto, apenas corrigir
a base de cálculo do IPTU...
Mas essa
é uma forma de enrolar a todos. Porque, se for corrigir, tivemos um “boom” no
aumento do preço dos imóveis em Brasília, exatamente no período da última
avaliação. É bom que não se esqueça disso. Quando se lançou os apartamentos do
Noroeste, eles tinham valor muito maior do que o de hoje. O que quero
dizer é que temos de criar alternativas para aumentar a receita, mas isso deve
ser feito com muito cuidado, com muita atenção, com muita discussão.
Acha que o governo tem força para desocupar a orla do lago?
Pode ter
força, mas não tem recursos para manter essas áreas. Não adianta tirar quem
está cuidando, pegar a área e não cuidar dela. Vai ser uma catástrofe. Temos de
pensar que a orla é uma coisa enorme. Se o governo tivesse um projeto para
ocupar com qualidade, aí, sim. O que nós temos para oferecer às pessoas para
passear no lago? Praticamente nada.
Sobre as concessões e as PPPs, o senhor acha que elas podem
ser feitas em quais áreas?
O governo
não precisa administrar determinados equipamentos, como zoológicos, estádios e
alguns centros de cultura. Isso pode ser terceirizado, com clareza e qualidade.
Mas a primeira coisa que tem de ter é a confiança. Imagine um governo que passa
por um momento de desconfiança no pagamento de contas. Quem é que vai investir
dinheiro? Esse é o pensamento do investidor. Isso vale para todos, local
e nacional. Um dos princípios básicos é recuperar a confiança para que as
pessoas acreditem. Vimos umas concessões que foram colocadas e que não apareceu
ninguém interessado.
Mas o senhor é a favor da terceirização da saúde?
A nossa
Constituição faculta que isso pode ser feito pela iniciativa privada, mas acho
que algumas funções são obrigações do Estado, como saúde, educação, segurança e
até mobilidade. Como vai privatizar a segurança do cidadão, a segurança
patrimonial? Não tem como. São funções do Estado.
O governo estuda a gestão compartilhada de hospitais, como
temos a do Hospital da Criança. O que o senhor acha?
Acho que
pode acontecer, mas tem de que ir com calma. Já temos uma forte presença da
iniciativa privada na área da saúde, mas acho que tem que ser para
complementar a função do Estado e não o oposto.
Como avalia o cenário político-econômico atual?
Há alguns
anos, pesquisamos empresas de pequeno e médio portes. Até o fim de 2012, essa
pesquisa apresentava resultados crescentes, muito maior do que os índices
nacionais. Foi o “boom” de desenvolvimento da micro e pequena empresa em
Brasília e no país. As pessoas estavam atrás de comodidade, de proximidade, em
razão da estabilidade da moeda, das baixas taxas de juros. Houve um bom
crescimento do comércio de serviço em Brasília nos anos sucessivos. Isso fez
com que todos crescessem, inclusive os pequenos negócios. Mas, à medida que
você dificulta o crédito e há a diminuição da confiança e da ameaça do
desemprego, o consumidor começa a restringir os hábitos de consumo, com medo do
futuro. Isso atrapalha. O que estamos vivendo é um excesso de pessimismo.
O pessimismo piora com a instabilidade política?
Não há
dúvida. Na medida em que falta um norte, projetos de infraestrutura e de
investimentos, o mundo empresarial se retrai. Os investidores, mesmo tendo
recursos, ficam esperando para ver o que vai acontecer. Então, mesmo os que
dispõem de recursos ficam reticentes, aguardando um desfecho em nome da
segurança (econômica), da confiança, da segurança jurídica. Imagine você fazer
um investimento e descobrir, depois, que mudam todas as regras. Isso também
ocorre nos pequenos negócios, com os pequenos empresários. Eles pensam: “Não
vou aumentar a lojinha, não vou abrir um novo mercado, vou esperar a passagem
desta crise”. Então, seria preciso que houvesse uma palavra de incentivo, que
alguém fosse mais otimista.
O fato de a presidente ter dado uma declaração dizendo que
não renuncia deixa o cenário mais calmo?
Se alguém
vai julgar a presidente, é o Poder Legislativo. Certamente baseado (em provas),
se houver essa reprovação das suas contas. Essa é uma vertente. A outra
vertente é que ela é objeto de denúncias no Tribunal Superior Eleitoral, que é
outro fórum de julgamento. Aí, estão centradas duas vertentes: a que julga a
questão da própria campanha, e a outra, que julga o governo.
O setor produtivo espera para ver o que vai acontecer depois
disso?
Isso é um
sentimento que existe na cabeça de todos, principalmente dos mais bem
informados, dos investidores internacionais. Passamos por uma crise envolvendo
os grandes empresários.
O fato de grandes empreiteiros estarem atrás das grades
também assusta os investidores?
É um fato
sui generis. É preciso buscar uma alternativa, porque algumas empresas são
multinacionais. Não sabemos se são as empresas ou se são as pessoas. Olha a que
ponto chegamos. Há a tese de que as empresas não devem participar de futuras
licitações, de futuros projetos, mas há também quem defenda em trocar as
pessoas. Assim, ficam as empresas. Todas essas coisas estão em julgamento,
estão em análise, e contribuem para o momento em que estamos vivendo de
insegurança.
Fonte: Ana Maria Campos - Mariana Laboissière - Correio Braziliense - Foto - Ronaldo Oliveira /CB/D.A Press.