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O supremo Joesley

O Brasil acompanha um dos julgamentos mais surreais de sua história. De um lado, Joesley Batista e a colaboração premiada que o livra de responder por, pelo menos, 240 condutas ilícitas, que poderiam resultar em 2 mil anos de prisão. Do outro, o STF, a instância máxima da Justiça no país, e o acalorado debate sobre se o plenário da Corte tem ou não poder para rever os benefícios da delação, caso se descubra, mais adiante, uma possível ilegalidade no acordo. E que acordo! Ele garante ao delator — em troca da cabeça de Temer numa bandeja — levar vida de rei em Nova York, beneficiado com dinheiro do BNDES (leia-se: do povo brasileiro), obtido, supostamente, em troca de generosas propinas.  

Sabemos todos que, sem as delações premiadas, dificilmente, os políticos e empresários ladrões jamais seriam descobertos e punidos. A questão é que há pontos obscuros demais envolvendo o acordo com Joesley. Nunca um delator havia sido premiado com tantos privilégios. Nem no caso da Odebrecht, com a delação do fim do mundo. Marcelo, o ex-todo-poderoso dono da maior empreiteira do país, por exemplo, continua preso em Curitiba. E, no caso JBS, ainda paira a suspeita de que Joesley nem sequer entregou o verdadeiro chefe da quadrilha. 

Afinal, ele foi alçado à condição de "campeão nacional" e fez fortuna com dinheiro do BNDES à época dos governos Lula e Dilma. Mas afirma que o chefão da quadrilha era o vice de Dilma, Temer? Sim, o Brasil inteiro sabe que PT e PMDB eram sócios no governo, mas o chefe era Temer? Logo ele, que reclamava de ser figura decorativa na gestão da petista? E se, amanhã, a CPI que investiga o caso descobrir que Joesley mantinha com Lula e Dilma conduta ainda menos republicana? Afinal, ele confessou que, a mando do PT, entregou a merreca de R$ 35 milhões a senadores do PMDB sem que o chefão Temer nem sequer soubesse. Mesmo assim, o acordo de delação com a JBS seguirá intocável? 

Polêmico, como de costume, o ministro Marco Aurélio Mello foi direto ao ponto: se abrir mão dessa prerrogativa, destacou ele, o plenário do STF estará dando ao procurador-geral da República, que fechou o acordo, um poder não previsto na Constituição e em nenhuma lei. "Nunca vi Ministério Público definir pena. Quem define pena é o Judiciário", observou. "Deve ser o novo direito", ironizou Gilmar Mendes, que travou um tenso debate com o colega Luís Roberto Barroso, principal defensor da proposta de que o acordo de delação premiada não pode ser revisto. Tese, aliás, que nem o relator do caso, Edson Fachin, abraçou, de início. "A última palavra será sempre do plenário", sublinhou Fachin, no primeiro dia do julgamento, na terça-feira. 

Na quinta-feira, o ministro Ricardo Lewandowski foi ainda mais incisivo ao indagar sobre qual seria o comportamento da Corte diante da descoberta de uma possível fraude no processo. "Se o plenário perceber alguma ilegalidade, inconstitucionalidade, que não foi percebida pelo relator, ele vai fechar os olhos?", perguntou. Pelo andar da carruagem, a resposta é sim. Por mais surreal que possa parecer, o pleno do STF se inclina nessa direção.

Por Plácido Fernandes Vieira – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google

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